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PLD-FT em fintechs

O sistema econômico atual permite a criação e desenvolvimento de instituições financeiras. Junto a isso, faz-se necessário a implantação de mecanismos específicos para cada setor, que combatam todas as possíveis infrações penais, como lavagem de dinheiro e o financiamento do terrorismo, além de outros crimes contra o Sistema Financeiro Nacional e outras fraudes. Diversos segmentos já contam com determinações e procedimentos com este objetivo, porém, como o setor está sempre se renovando, algumas áreas ainda não possuem regulamentações específicas de prevenção a crimes econômicos, como é o caso das fintechs – que enfrentam, ainda, diversos desafios regulatórios no âmbito da supervisão bancária.

Mas o que são fintechs? O termo surgiu da combinação das palavras em inglês financial (finanças) e technology (tecnologia). São startups que geram soluções tecnológicas para questões financeiras. O surgimento delas deve-se à necessidade de contrapor as altas taxas cobradas pelos bancos, a escassez de crédito e a burocracia das instituições financeiras. Seu funcionamento assemelha-se ao de um banco, porém, em uma fintech, a tecnologia é muito utilizada para trazer conveniência por meio da inovação: as empresas do ramo utilizam recursos tecnológicos para criar metodologias, processos e ferramentas que facilitam o acesso a serviços financeiros, em modelos baseados no ganho de eficiência com o menor custo possível para o usuário e uma estrutura enxuta.

As primeiras tentativas de implantação destas startups surgiram, no mercado mundial, após a crise financeira de 2008, que abalou a confiança na higidez do sistema financeiro internacional. No Brasil, a proliferação ocorreu entre os anos de 2014 e 2016, em um ecossistema que cresce mais a cada ano. De acordo com pesquisa realizada pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento e a Finnovista, em maio de 2017, as fintechs brasileiras representavam 33% deste mercado na América Latina, tendo 230 das 703 fintechs. Hoje, o Brasil é o segundo maior ecossistema de fintechs na região, atrás somente do México.

Cada fintech tem um modelo próprio de negócio, não sendo possível determinar apenas uma finalidade. Mas, via de regra, as empresas do setor voltam-se para o desenvolvimento de soluções que superem deficiências ou limitações de serviços financeiros tradicionais. Assim, boa parte das empresas do segmento oferece serviços ou produtos bem específicos. Na maioria dos casos não há, como nos bancos, uma ampla diversidade de serviços. Isso é positivo porque a empresa consegue ficar focada em melhorar os seus processos.

De acordo com a Finnovation, o Brasil apresentou, em 2017, 309 startups financeiras, sendo a maior parte para o setor de Pagamentos, 86 fintechs neste segmento, representando 28% deste mercado. Em seguida, vem as startups de Gestão Financeira Empresarial, com 58 nesta área, o que significa 19% do total. Logo atrás, vem o grupo das fintechs de Crédito. Outra área que chama a atenção pelo crescimento é a de Identidade, que busca ajudar nos processos de know your client (conheça seu cliente) e prevenção à lavagem de dinheiro. Já são atualmente 21 startups neste segmento.

Confiabilidade das fintechs

Mesmo com todas as facilidades que o setor propõe, por meio do uso da tecnologia, não se pode deixar de lado cuidados em relação à segurança. Muitas fintechs conseguem ser mais atraentes que os bancos por derrubarem processos burocráticos, por exemplo. Isso é positivo, mas eventualmente pode expor o cliente ou o próprio negócio a determinados problemas, por exemplo, ao descartar um processo que checa a legitimidade de uma informação.

Por esta razão, é importante que as fintechs divulguem as companhias com as quais realizam parceiras, o cumprimento de normas de mercado, se tem queixas em órgãos de defesa do consumidor. Também é essencial apresentar política clara de proteção à privacidade, investimento em segurança da informação, adoção de medidas de combate a fraudes, implantação de canais eficientes de comunicação com clientes, entre outras medidas.

Além disso, a empresa precisa ser clara ao apresentar a proposta do negócio. Se a fintech oferece serviços com preços muito baixos ou com isenção completa de tarifas, precisa deixar claro como obtém — ou, ao menos, planeja obter — receita. Do contrário, a empresa poderá ter problemas operacionais ou, até mesmo, demonstrar envolvimento com atividades ilegais.

 

Regulamentações para o setor

Diante de tais dificuldades, é essencial que a fintech zele por seus processos para que seja a melhor opção para um possível cliente. Todavia, para os órgãos de fiscalização, no Brasil, a área ainda tem uma representatividade pequena. Desta forma, para eles, desenvolver regulamentações específicas, neste momento, pode representar um engessamento de algo com potencial de crescimento. O desafio do sistema de supervisão bancária no Brasil e no mundo é atuar de forma a não sufocar as inovações e, ao mesmo tempo, zelar pela estabilidade e solidez do sistema, superando a visão pela qual a regulação, muitas vezes, é vista como barreira para o crescimento das fintechs.

Vale dizer ainda que a falta de regulamentação específica não é só uma preocupação do Brasil, pois o Conselho de Estabilidade Financeira da Europa (FSB), formado por bancos centrais, reguladores e autoridades de ministérios de finanças do G20, tem forte preocupação sobre uma regulamentação do setor, para proteger o sistema financeiro como um todo.

Regulamentações no Brasil

Mesmo sem muitas determinações, o Brasil apresentou algumas regras para o desenvolvimento do setor. Uma destas resoluções é a 4.480/16, do CMN (Conselho Monetário Nacional), que se adiantou ao desenvolver uma regulamentação voltada para a abertura e encerramento de conta via internet. A resolução determina que as instituições financeiras adotem procedimentos e controles que permitam confirmar e garantir a integridade, a autenticidade, a confidencialidade e a segurança das informações e documentos eletrônicos exigidos, bem como adotar procedimentos para assegurar a confiabilidade das tecnologias empregadas no processo. Além disso, determinam a aplicação, para as contas abertas por meio eletrônico, das mesmas regras das contas de depósito, sejam as relacionadas à situação cadastral e cobrança de tarifas, sejam à prevenção à lavagem de dinheiro e ao financiamento do terrorismo.

 

Desta forma, as fintechs devem confrontar informações de clientes com bancos de dados públicos ou privados, manter dados armazenados por cinco anos, ter submetido à auditoria procedimentos estabelecidos em manual, além de encerrar contas com irregularidades.

Além disso, a CVM (Comissão de Valores Mobiliários), em junho de 2016, por meio de uma portaria, criou o núcleo especializado para acompanhamento de inovações tecnológicas no mercado de capitais, o FinTechHub. O núcleo visa o monitoramento de mudanças tecnológicas, além do desenvolvimento de ações educacionais e de orientação voltadas a empreendedores, sobre aspectos regulatórios de serviços e produtos financeiros, canal para comunicação direta com o setor responsável, debates, reflexões e pesquisas em Fintech, entre outras medidas.

Por fim, o Banco Central, em 2018, desenvolveu a resolução 4.656, que apresenta regras que as fintechs de crédito e financiamento devem seguir. Visando estimular a oferta de crédito, em meio eletrônico, a resolução afirmou não ser mais necessário o vínculo a uma instituição financeira convencional para a realização destas atividades.

Além disso, segundo a regulamentação, fintechs de crédito podem formar uma Sociedade de Crédito Direto (SCD) ou uma Sociedade de Empréstimo entre Pessoas (SEP). Na primeira modalidade, a fintech pode oferecer crédito com recursos financeiros próprios. Na segunda, a fintech organiza uma plataforma de crédito em que os recursos são provenientes de pessoas físicas ou empresas, não operando com capital próprio.

Porém, nos dois casos, a proposta é de que seja vedada a captação de recursos junto ao público, ou seja, não poderá haver depósitos de clientes nestas instituições. Além disso, deve ser proibida uma denominação fantasia que faça referência a outra instituição, que já seja regulamentada. Por fim, as empresas entrarão no rol das instituições fiscalizadas e reguladas pela autoridade monetária, inclusive sob ótica do combate à lavagem de dinheiro.

O Banco Central também já está estudando uma nova regulamentação para a área de pagamentos instantâneos, cuja minuta da consulta pública deve ser divulgada até agosto desse ano.

Assim como ocorre com os bancos tradicionais, como alguns serviços implicam em movimentação de dinheiro, devem sempre ser respeitadas as normas que visam a prevenção à lavagem de dinheiro e fraudes devendo, por consequência, haver submissão à fiscalização do COAF- Conselho de Controle de Atividades Financeiras.

Mesmo com representatividade pequena para a economia, de acordo com os órgãos de controle, as fintechs já apresentam um crescimento considerável desde sua criação, além do fato de sinalizar um caminho para o futuro. Assim, é importante que todas as áreas do setor estejam atentas ao funcionamento e as responsabilidades das instituições existentes e daquelas em formação, para que o Brasil desenvolva mecanismos cada vez mais eficientes para o combate à lavagem de dinheiro, financiamento do terrorismo, além dos diversos crimes financeiros.

Mesmo sem regulação específica, já houve punição para fintech

Um exemplo de que as fintechs não caminham, no Brasil, sem nenhum tipo de fiscalização, foram os processos administrativos abertos pela CVM e BACEN, em 2010, contra a Fairplace, fintech indiciada pela prática de infrações financeiras.

A Fairplace funciona como uma espécie de rede social, em que as pessoas físicas se conectam e negociam diretamente contratos de empréstimos, sem a intermediação de bancos. A operação usava o slogan: “Me adiciona. E me empresta algum”.

Poucos meses após o lançamento, a fintech teve suas atividades encerradas, já que a forma de concessão de crédito foi entendida pelos órgãos reguladores como intermediação financeira, ou seja, exerce o papel de instituição financeira, sem ter autorização para isso.

A defesa da Fairplace era de que não usava o dinheiro, mas apenas recebia os recursos e os repassava aos tomadores. Porém, como os recursos passavam por contas da empresa era necessário que esta tivesse autorização do Banco Central. Vale lembrar, o funcionamento como instituição financeira sem autorização do órgão supervisor, além de infração administrativa, constitui crime contra o Sistema Financeiro Nacional.

Também, no último mês, a Neon Pagamentos teve sua imagem arranhada após a liquidação, pelo Banco Central, do Banco Neon, instituição financeira tradicional de mesmo nome que operava em parceria com aquela fintech, possibilitando depósitos por boleto bancário, emissão de cartão de crédito, entre outros serviços que dependiam de autorização do órgão supervisor. A liquidação foi decretada em razão de irregularidades na área de compliance, PLD e gerenciamento do risco de liquidez daquele Banco – embora, frise-se, que não foi identificada nenhuma irregularidade na Neon Pagamentos.

Estes processos evidenciam que, mesmo sem uma regulamentação específica, as instituições já são fiscalizadas, podendo ser punidas e ter atividades interrompidas, sendo necessário observar a legislação a qual se encaixa e segui-la.

 

Referências

Gazeta do povo

Infowester

BCB

Migalhas

Valor

Magalhaes Law

Folha

BCB

CVM