Em fase de estudo no Brasil, a novidade tem diversas utilizações e peculiaridades que demandam atenção redobrada
Real digital é o nome escolhido para a CBDC brasileira. A sigla significa Central Bank Digital Currency, ou Moeda Digital do Banco Central. Sua implementação está sendo estudada a todo vapor em diversos países – e já começou nos Estados Unidos, China, Japão e Bahamas. Por aqui, a força-tarefa destacada pelo Banco Central também tem trabalhado com foco e responsabilidade. Sem imprevistos no caminho, podemos esperar uma primeira modalidade de serviço se abrindo ao público no final de 2024.
O cenário hoje é de crescente tokenização de ativos. Na ausência de uma moeda digital emitida pelos bancos centrais nesse ambiente, adquirem-se aquelas oferecidas por emissão privada (stablecoins) para a liquidação dessas transações. Sem regulação adequada e sem as garantias fornecidas por um banco central, essas negociações ficam expostas a riscos que podem comprometer a estabilidade financeira.
Mas não se trata apenas de uma forma de combater a informalidade. Os bancos centrais querem ser atores nesse processo, incentivar inovações tecnológicas, tornar o sistema financeiro menos custoso e os ativos mais acessíveis.
Algumas possibilidades de uso
É claro que esse movimento internacional contínuo de digitalização das trocas financeiras traz uma série de vantagens justificadamente desejáveis. Porém, como já ocorreu com outras novidades no passado, os desafios envolvendo a regulamentação e monitoramento de criptoativos são, por ora, um problema universal. Institucionalizar as moedas digitais pode ser um caminho, ainda que indireto, para se infiltrar nesse mercado e ampliar seu controle.
Para tanto, é preciso um produto atraente. Enquanto o valor das criptomoedas pode variar drasticamente de uma hora para a outra, a proposta da CBDC é uma moeda com operacionalidade semelhante, porém com valor garantido por um banco central.
Com o PIX, o Brasil se encontra na vanguarda da acessibilidade das transferências financeiras de varejo. Enquanto outros países veem na CBDC uma forma de viabilizarem algo semelhante, podemos nos concentrar em outras potencialidades.
Os smart contracts, contratos inteligentes, são dos usos mais citados nas discussões aqui no país. São contratos programáveis, que costuram as condições de maneira que o negócio apenas se concretiza se todas as cláusulas são atendidas. Exemplos comuns são as vendas de imóveis e veículos. Um carro, posto em contrato como um bem tokenizável, será transferido apenas com o pagamento recebido, e o pagamento só irá para a conta do vendedor quando ele passar o carro para o nome do comprador. Ou todas as cláusulas são cumpridas e o negócio automaticamente se concretiza, ou nada acontece. Isso retira da negociação o peso da desconfiança e os custos de um terceiro imparcial.
Também os pagamentos transfronteiriços seriam menos custosos com uma CBDC, que tornaria a transferência interbancária mais direta. Ainda, o acesso a produtos financeiros, tais como títulos do Tesouro Nacional, necessitaria menos intermediários, aumentando sua acessibilidade.
O que esperar quanto à PLD
O real digital é uma nova forma de uso da moeda que possibilita um alto índice de monitoramento. Seus caminhos deverão ser todos lastreáveis, com registros precisos. Mas não é tão simples assim. Há características na natureza das transações de criptomoedas que podem mascarar a identidade dos envolvidos, o que não deve ser aceitável. Ainda assim, para o plano funcionar, é preciso que o real digital, além de atrair com suas vantagens econômicas, dê amplas garantias de privacidade e confidencialidade, na letra da lei.
É um produto que demanda segurança cibernética do mais alto nível, o que se espera que transpareça no desenho de sua regularização. Na outra ponta, das operadoras, da mesma forma que cada instituição financeira desenvolve sua metodologia interna de PLD, a depender do porte e dos serviços com os quais trabalha, precisarão se adaptar para garantir que também as transações via real digital estejam cobertas de acordo com as orientações que se apresentarão.
Vale acrescentar que o Banco Central não está alheio à importância da operacionalidade off-line do ponto de vista da cidadania, e busca alternativas. Também, como dito, uma das vantagens das CBDCs é a diminuição dos custos das transferências internacionais. São dois exemplos sensíveis no que toca à PLD-FTP e que demonstram os grandes desafios que estão pela frente.
Hoje contamos com opções interessantes de plataformas dotadas de inteligência artificial e machine learning para diferentes usos de aferição de risco. O sucesso da empreitada, tratando-se de um alvo tão virtualizado, dependerá em enorme medida das soluções advindas da própria tecnologia da informação.
Cooperação
Por todo o mundo há discussões acaloradas sobre o tema, inclusive com alguns países pioneiros dando já exemplos concretos. Da mesma forma que no passado acordou-se sobre a interdependência financeira mundial e a necessidade de ações conjuntas contra a lavagem de dinheiro, financiamento ao terrorismo e à proliferação, é necessário que a implementação das CBDCs seja também fruto de colaborações generosas e sem fronteiras.
Referências
Revisão especializada de Lucas Teider
Voto 31/2023–BCB, de 14 de fevereiro de 2023
LIFT Talks – Real Digital: Como participar e ajudar a construir o Real do futuro
BC apresenta diretrizes para o potencial desenvolvimento do real em formato digital
BC te Explica #76 – O que é uma CBDC, uma moeda digital de banco central
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Conexão Real Entrevista #1 – CBDC, a Moeda Digital dos Bancos Centrais
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